Um trabalho realizado com homens que agrediram mulheres e cumprem pena alternativa em razão de violência doméstica está contribuindo com a redução da reincidência desse tipo de comportamento em Montes Claros, no Norte de Minas. Desde janeiro do ano passado, cerca de 260 homens participaram de grupos temáticos, reflexivos e de responsabilização da Lei Maria da Penha, realizados pelo programa Central de Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas (Ceapa), da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). Desde então, nenhum deles voltou a ter histórico de envolvimento com violência contra a mulher.
O trabalho nos grupos temáticos tem o objetivo de estimular mudanças de atitude e de comportamento a partir da reflexão de formas não violentas para resolução dos conflitos. Nos encontros – em média os homens participam de 10 reuniões, realizadas uma vez por semana – os homens falam das suas histórias de vida, de como se sentem antes e depois das agressões, quais comportamentos eles acreditam que motivam isso e são convidados à reflexão. Ao mesmo tempo, os profissionais que atuam nestes grupos – em geral psicólogos, advogados, terapeutas ocupacionais, entre outros – esclarecem e ensinam sobre a Lei Maria da Penha, suas consequências, sobre os diferentes tipos de violência que são enquadrados na lei, como moral, sexual, entre outras questões.
Clauber Fernandes, por exemplo, é um dos que acreditam que o trabalho realizado pelo programa Ceapa no acompanhamento de agressores faz a diferença. Há dois meses, ele terminou seu ciclo no grupo reflexivo e afirma que a participação fez toda a diferença para sua compreensão da violência, das questões que o levavam a ser violento e, principalmente, para a sua mudança de comportamento. “Eu acredito que saí dos encontros como um multiplicador. Antes eu não conseguia compreender que estava sendo violento. Graças a Deus não cometi algo mais sério como um feminicídio. Com certeza o grupo e a equipe me auxiliaram nessa transformação para um companheiro melhor e menos violento”, disse.
De vítimas à mudança de comportamento
Na opinião da gestora social da unidade onde acontecem as ações do programa Central de Alternativas Penais em Montes Claros, Vanessa Alves Silva, é preciso ouvir e cuidar desses homens para que eles não voltem a cometer as agressões. Segundo ela, eles chegam “queixosos” aos atendimentos e se “vitimizando” e, apenas com o passar do tempo, é possível verificar as mudanças de pensamento e atitude.
“Eles chegam aqui atribuindo a causa da violência à mulher, à bebida ou a qualquer outra motivação e quase nunca têm consciência de sua responsabilidade. Por isso acredito na importância do nosso trabalho na redução da violência, pois focamos no autor do ato. Fazemos o homem mudar de comportamento, ao mesmo tempo que aprendem a lidar com a raiva, o sentimento de posse e o machismo enraizado no cotidiano”, explica. “É preciso reeducar o agressor para que seja promovida uma cultura de diálogo, compreensão e paz nas famílias”, complementa.
Facilitadora dos grupos de trabalho com os homens agressores, a analista social Renata Rocha avalia que o trabalho realizado pelo grupo reflexivo com agressores não se trata de aulas ou cursos, com professores que ensinam e alunos que aprendem. Os trabalhos passam por processos de elaboração de ideias e compreensões que os próprios participantes produzem a partir das trocas de experiências. Dessa forma, segundo Renata, os homens se reconhecem como autores responsáveis pela violência praticada e, assim, conseguem modificar seus comportamentos. “No Brasil, o maior motivador da agressão contra mulher é a cultura machista. Por isso insistimos em trabalhar questões sobre a lei, convivência familiar e sobre a cultura da violência”, ressaltou.
A Ceapa
O programa Ceapa tem como objetivo contribuir para o fortalecimento e a consolidação das alternativas à prisão no Estado, pautando ações de responsabilização com liberdade. Nos municípios, a Ceapa se estrutura implantando Centros de Alternativas Penais compostos por profissionais com formação em Direito, Psicologia e Serviço Social, que trabalham de forma interdisciplinar.
As modalidades de alternativas penais desenvolvidas pelo programa são: prestação de Serviços à Comunidade; projetos Temáticos de Execução de Alternativas Penais por tipo de delito cometido (violência doméstica e intrafamiliar contra a mulher, drogas e trânsito); atendimentos individuais ou grupos Reflexivos de responsabilização de homens processados e julgados no âmbito da Lei Maria da Penha; projetos no âmbito das Medidas Cautelares; projetos e práticas restaurativas.
Texto: Poliane Brandão
Fotos: Divulgação Sesp